Uma visão crítica sobre o tratamento.
A maioria das crianças cadeirantes, devido à espasticidade, portadoras de paralisia cerebral do tipo tetraparesia, com grande comprometimento motor de membros superiores e inferiores, são tratadas inicialmente com fisioterapia.
Os objetivos iniciais são o ganho de amplitude de movimentos articulares, prevenção de deformidades e ganho de aptidões motoras.
O uso de órteses, aparelhos usados nos membros, mantendo as posições articulares, também é fundamental e deve ser iniciado precocemente na vida da criança.
Mesmo com o tratamento iniciado precocemente, a história natural esquelética mostra que, progressivamente, à medida que a criança cresce, as deformidades tendem à piora.
Para controlar essa evolução desfavorável, várias etapas devem ser respeitadas e efetuadas no quesito tratamento.
Existem várias modalidades de terapia indicadas, sendo as principais:
– Fisioterapia motora;
– Fisioterapia respiratória;
– Hidroterapia;
– Terapia ocupacional;
– Órteses;
– Aplicação de Botox em músculos encurtados.
– Correção cirúrgica das deformidades articulares.
Uma criança que não reúne condições motoras para caminhar, devido ao grande comprometimento motor, pouco equilíbrio da cabeça e tronco, deve ter seu tratamento voltado para prevenção e correção de deformidades, manutenção dos segmentos móveis, para que possa ficar sentada adequadamente em cadeira de rodas, com conforto e sem dor.
Outro objetivo em manter as articulações bem alinhadas seria a possibilidade de colocar a criança em pé para que possa fazer o que chamamos de transferências, ou seja, ter a capacidade de ficar em pé, sempre com auxílio de um cuidador ou de fisioterapeuta e, com isso, sair da cadeira para outros cômodos do domicílio, sem precisar ser carregada no colo.
Sem dúvida, isso facilita muito o manuseio da criança, além de manter seus membros sem deformidades estigmatizantes para todos.
O que faz uma criança espástica sentar adequadamente?
– O bom posicionamento dos quadris, com manutenção dos movimentos, sem contraturas fixas, ou seja, sem posições viciosas rígidas;
– Preservação da mobilidade dos joelhos, sem atitudes em flexão excessivas fixas;
– Coluna vertebral bem alinhada.
Como fazer a criança ter esses pré-requisitos?
O tratamento é longo, com várias etapas que se complementam e que, obrigatoriamente, precisam ser executadas passo a passo.
Sabemos hoje que crianças com grave comprometimento motor por espasticidade, na maioria das vezes, não conseguem manter suas articulações bem posicionadas durante todo o crescimento, só com as modalidades de fisioterapia como tratamento isolado.
A história natural, mesmo com a fisioterapia adequada, é para alguma piora das deformidades, exigindo terapias complementares.
Essa é uma informação importante. A fisioterapia sozinha, associada ou não ao uso de órteses, tem suas limitações, reconhecer isso é muito importante, tanto por parte do fisoteraputa como dos familiares da criança.
Não significa dizer que a fisioterapia foi mal feita, porém precisamos reconhecer que de forma isolada, tem suas restrições.
O tratamento é multidisciplinar, sendo muito importante o acompanhamento ortopédico e a interação entre os profissionais médico e fisioterapeuta.
As modalidades de terapias se complementam e devem ser feitas de forma simultânea, visando sempre o melhor desempenho da criança.
Nos momentos em que as deformidades progridem, a rigidez articular piora e as posições viciosas ficam fixas, o trabalho fisioterápico fica ineficaz, então precisamos mudar a estratégia, associar outra modalidade.
A criança tem desconforto doloroso para ser manipulada, pouca tolerância para ficar sentada na cadeira de rodas e usa analgésicos com frequência, piorando muito a qualidade de vida.
Neste momento, o que fazer?
O papel do ortopedista pediátrico:
Na verdade, o cenário citado acima é um quadro de evolução tardia, sem o devido acompanhamento ortopédico regular.
Não devemos esperar momentos de graves deformidades para atuarmos.
Com o tratamento regular e acompanhamento, as indicações adequadas são feitas antes de graves deformidades surgirem e antes da criança apresentar quadros dolorosos de difícil controle.
Identificado problemas e organizando o tratamento:
Um bom exame físico ortopédico, feito com a criança fora da cadeira de rodas, deitada na maca, onde cada segmento articular é manipulado e analisado em conjunto, é muito importante para organizar o tratamento.
Dependendo da idade de criança, do segmento articular envolvido, do grau de rigidez e deformidade existente, serão indicados modalidade de tratamento adicionais:
O Botox:
Medicamento injetável intramuscular em músculos com encurtamento, cujo objetivo é o de promover o relaxamento adequado, facilitando o manuseio e ganho de mobilidade da articulação em questão, aliviando as contraturas.
Tem ação temporária, precisando nova aplicação a cada 6 meses.
Na maioria das vezes, não impede a realização de cirurgias mas prorroga as indicações e impede que nos momentos cirúrgicos, as deformidades sejam graves.
Cirurgias ortopédicas corretivas:
As indicações também dependem das idades, do grau de deformidade de cada segmento e do alinhamento radiológico das articulações.
São cirurgias em múltiplos níveis, no mesmo ato anestésico, permitindo correções de múltiplas articulações.
Há uma combinação de cirurgias nos músculos encurtados e correções ósseas, quando necessárias.
O pós operatório é feito com imobilizações gessadas por curto período, seguido do uso de órteses e retorno da criança para a fisioterapia em melhores condições para trabalho e ganho motor.
Ser cadeirante não significa ser abandonado na cadeira de rodas.
Diga não à negligência!
Muitas instituições de reabilitação contra indicam qualquer investimento terapêutico em crianças cadeirantes, a não ser fisioterapia de forma isolada.
Contra indicam as aplicações de botox em músculos encurtados e, muito menos, as correções cirúrgicas.
Isso é um absurdo nos dia atuais!
As justificativas para isso são inaceitáveis!
Alegam que:
– Por que corrigir os pés deformados se seu filho não vai andar?
– Por que corrigir os quadris com cirurgia, se não há previsão de marcha?
– Não deixem operar seu filho, porque é paciente especial e tem risco de complicações anestésicas.
Essas alegações, na verdade, escondem a incompetência de alguns serviços de reabilitação, que estão desatualizados com a filosofia atual do tratamento, além de não terem estrutura adequada para oferecer o tratamento completo.
Acima de tudo, com essas alegações, não estão sendo honestos com as crianças e famílias que estão aflitas à procura de alívio para o sofrimento dos filhos.
A sensação de impotência dos familiares é enorme: vêem seus filhos tendo suas articulações deformando progressivamente em função da história natural, com piora da qualidade de vida e conforto, sem terem a oportunidade de continuarem as etapas de tratamento pelo simples fato de terem recebido contra indicação para as terapias complementares sem nenhuma justificativa plausível para isso.
Minha função é de divulgar para a opinião pública, médicos, fisioterapeutas, que existem modalidades de terapia eficazes em dar bem estar, vida digna e saudável as crianças e adolescentes cadeirantes.
Tenham avaliação adequada para seus filhos, não permitam que atitudes negligentes sejam tomadas.
Procurem avaliação de profissionais capacitados para as indicações de tratamento.
O acompanhamento ortopédico deve iniciar precocemente, ser regular durante todo o crescimento da criança, para que bons resultados sejam obtidos.
Um abraço a todos!
Dr. Maurício Rangel é formado em Medicina pela Faculdade Souza Marques (1994) e médico Ortopedista Pediátrico. Trabalha atualmente em consultórios com atendimento ambulatorial e cirurgias ortopédicas pediátricas eletivas. Especialista em diversas patologias musculoesqueléticas em crianças e adolescentes e cirurgias relacionadas.
Consultório: Barra Life
Av. Armando Lombardi, 1000 – sala 231, bloco 2, Barra da Tijuca | Rio de Janeiro
Telefone para contato: 3264-2232/ 3264-2239
Criança e Saúde
Criança e Saúde é um site colaborativo que possui a missão de ajudar pessoas a encontrarem informação sobre a saúde dos seus filhos. As informações publicadas neste site têm caráter meramente informativo e não substituem o aconselhamento e acompanhamentos de médicos, nutricionistas, psicólogos e outros especialistas. Todos os direitos reservados ao Criança e Saúde. Proibido a reprodução do conteúdo deste site sem prévia autorização. A Redação do Criança e Saúde não se responsabiliza por conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo este último de inteira responsabilidade dos anunciantes.
contato@criancaesaude.com
Comments